A MAÇONARIA E A IGREJA CATÓLICA

03/09/2011 15:42

Por volta de 1.390, conforme registrado no Manuscriptus Regius, o relacionamento entre a Igreja Católica e a Maçonaria era bom. Naquela época, a Maçonaria Operativa (de ofício, dos construtores - veja texto neste site sobre Maçonaria Operativa e Maçonaria Especulativa) prestava serviços à Igreja, construindo catedrais. O chefe de cantaria normalmente era um clérigo, que orientava os obreiros, inclusive nos assuntos religiosos.

No que se refere ao Brasil, no final do século XIX, os padres defendiam abertamente idéias liberais, identificando-se com os maçons da época. Em conseqüência, muitos deles foram admitidos na maçonaria, alguns com o consentimento e outros contando apenas com a tolerância de seus Bispos.

A paz termina quando, numa homenagem prestada pelas Lojas Maçônicas do Rio de Janeiro ao seu Grão-Mestre, Visconde do Rio Branco, registra-se um incidente de maior monta. O padre Almeida Martins, que também era maçom, se apresenta na cerimônia em seus trajes de sacerdote e faz um discurso de saudação, representando a Loja do Grande Oriente do Lavradio, recebendo, por isso, uma punição do bispo diocesano, D. Pedro Maria de Lacerda. Reincidente em sua atuação, é, então, suspenso das ordens sacras. Começa aqui uma guerra surda em que os maçons passam a hostilizar a Igreja, enquanto esta, por seus bispos, age duramente contra os religiosos renitentes na prática da maçonaria. Ocorre, então, um incidente mais grave. O bispo de Olinda, D. Vital Maria Gonçalves de Oliveira, jovem de vinte e poucos anos, resolveu aplicar, na área sob sua jurisdição, as recomendações da Encíclica de 1.864, do papa Pio IX, proibindo o clero de participar de cerimônias patrocinadas por maçons. O bispo chama particularmente cada um dos sacerdotes envolvidos e ordena-lhes que se dediquem tão somente à vida religiosa, afastando-se de atividades estranhas aos conventos. Encontrando oposição, D. Vital acabou por suspender as irmandades recalcitrantes, impedindo-as de receber novos membros, de participar de ofícios religiosos e até de vestir os seus hábitos. Algumas dessas irmandades recorreram ao Governo e D. Vital, por sua parte, recorreu ao Papa, que lhe deu poderes para agir com rigor contra os rebelados. Está formada a confusão, provocada pela espúria união entre o Estado e a Igreja. O acordo entre o Governo e o Vaticano determinava que todas as bulas papais, para serem cumpridas no país, deveriam primeiro receber o "execute-se" do Governo Brasileiro, o que não acontecera com a Encíclica cujas recomendações o bispo insistia em aplicar. A crise agravou-se mais ainda quando o bispo do Pará, D. Antônio Macedo Costa, fez um protesto formal contra a maçonaria e se solidarizou com D. Vital.

O Governo apresentou ação criminal contra os dois religiosos, perante o Supremo Tribunal de Justiça, por desrespeito aos poderes do Império. Presos, os dois bispos foram levados ao Rio de Janeiro, julgados e condenados a dois anos de prisão com trabalhos forçados, sendo instaurados processos também contra outros padres que lhes deram apoio. Isto ocorreu em 1º de julho de 1.873, e, ao final, os dois bispos foram anistiados por decreto do Gabinete presidido pelo Duque de Caxias. Mas o desastre já acontecera e seus efeitos foram irremediáveis. Já no início do século XVIII a maçonaria trabalhava no sentido de separar a igreja do estado, instituir o casamento civil, instituir a liberdade religiosa, etc. As encíclicas papais que atacaram a Maçonaria explicitavam estas questões: o Papa Leão XII disse em sua encíclica de 13/03/1825: “as obras sobre religião e sobre a república que seus membros ousam dar a luz à publicidade...” A semente da república estava sendo lançada e os os líderes religiosos da época começaram a se preocupar com a possibilidade de perder o poder temporal.

O Papa Leão XIII em sua encíclica de 20/04/1884 disse: “os maçons defendem a idéia de que os chefes do governo têm poder sobre o vínculo conjugal. Na educação dos filhos não há nada a lhes prescrever em matéria de religião. A cada um deles compete, quando estiver em idade, escolher a religião que lhe aprouver. Já em muitos países, mesmos aos católicos está estabelecido que fora do casamento civil não há união legítima”. Nesta encíclica, o papa protestava veementemente contra a maçonaria, por estar defendendo a liberdade de religião e a instituição do casamento civil. Isto poderia ser traduzido em perda de influência da igreja sobre os féis. Leão XIII também disse nesta encíclica que: “segundo os maçons, todo poder está no povo livre; os que exercem o poder só são detentores pelo mandato ou pela concessão do povo”. A mesma encíclica afirmava que o poder pertencia a DEUS, o qual transferiu à igreja a responsabilidade de governar, ou de indicar alguém que fosse capaz de fazê-lo.

Outro fato digno de nota, é que, no final do século XIX e início do século XX, os esforços para a evolução social e política eram divididos entre os católicos conservadores, os liberais e os “cientificistas”. A Igreja Católica defendia o pensamento conservador e a maçonaria, o liberal. A Igreja tinha nas mãos as escolas que educavam somente os ricos; a maçonaria agiu no sentido de mudar esta situação. Criou escolas noturnas e conseguiu diminuir o custo do ensino, tornando-o mais acessível às classes menos abastadas.

Isto frustrou o objetivo da igreja, que era manter o status quo da época, ou seja, impedir que o poder mudasse de mãos.

Do início do século XX até os dias de hoje não se tem notícias de grandes conflitos entre a Igreja Católica e a Maçonaria. Aliás, é interessante mencionar que entre os membros da maçonaria estão inúmeros católicos praticantes e evangélicos. Em 1.984, após a publicação do novo código canônico, a Loja de Pesquisa Quatro Coroados de Londres fez uma pesquisa no Vaticano no sentido de saber como era vista a Maçonaria entre os clérigos. O resultado mostrou que a maioria achava que somente o grupo maçônico que havia tirado a crença em Deus de seus postulados fundamentais é que era condenável, ou seja, o Grande Oriente da França (com o qual os outros grupos maçônicos romperam); não havia nenhuma restrição quanto à maçonaria que exigia que seus membros acreditassem em Deus.

Entretanto, esta não era uma posição oficial, pois não tinha a aprovação das autoridades religiosas do Vaticano.

(Elias Mansur Neto)